BRINCAR e LINGUAGEM, qual a relação?
Mónica Monteiro, Terapeuta da Fala no Espaço Crescer • 9 de junho de 2020

O que é brincar?


Quando se pergunta às crianças o que é que elas mais gostam de fazer, a resposta é unânime: brincar. Mas o que é brincar? De acordo com a literatura, brincar é entrar num estado de faz-de-conta. É criar, imaginar e interagir com o outro. A criança brinca para descobrir o mundo, para descobrir as pessoas e as coisas que estão à sua volta. O brincar, para além de ser uma atividade divertida e prazerosa, é também a forma natural pela qual a criança se expressa, amplia os conhecimentos sobre si mesma e sobre o mundo que a rodeia.

A Importância do Brincar

Brincar? Sim, muito! Porque brincar é uma das “tarefas da infância com maior responsabilidade no desenvolvimento cognitivo, emocional, social e motor”. Através do brincar, a criança desenvolve a atenção, a memória, a imitação, explora e reflete sobre a realidade e o mundo onde está inserida. O brincar estimula a curiosidade, a confiança, proporciona o desenvolvimento da linguagem, do pensamento e da imaginação. São inúmeras as competências que as crianças desenvolvem ao brincar. Por estes motivos, o brincar constitui uma ferramenta indispensável na formação das crianças, pois contribui fortemente para o desenvolvimento global das mesmas.
 
O Brincar e o Desenvolvimento da Linguagem

O brincar é a primeira linguagem da criança. É através do brincar que a criança desenvolve pré-requisitos fundamentais para o desenvolvimento da linguagem, tais como: ouvir, observar, imitar, pegar a vez, formar conceitos e compreender símbolos. Além disso, é através das atividades lúdicas que a criança desenvolve a sua capacidade de socialização, comunicação e construção de pensamentos. O desenvolvimento da linguagem ocorre à medida que a criança cresce e se verifica o aumento progressivo da complexidade das suas brincadeiras.
De acordo com a literatura, a linguagem desenvolve-se mais facilmente quando a sua aquisição é realizada através do brincar. Ao brincar, a criança aprende uma série de competências linguísticas, tais como: identificar e nomear objetos, cores, formas, a construir frases simples, a realizar pedidos, a respeitar a tomada de vez, a compreender conceitos (ex.: grande/pequeno, duro/macio…) entre outras. Além disso, a utilização de frases mais complexas e o aumento das capacidades pragmáticas (adequação da linguagem ao contexto), surgem em primeira instância no contexto lúdico, o que leva a concluir que o brincar proporciona e beneficia as competências linguísticas.

As Etapas do Brincar e da Linguagem


Desde que nasce, o bebé aprende a comunicar através do palreio, dos sorrisos, da mímica, do contacto ocular e da proximidade física. Entre os 4 e os 8 meses, surgem as primeiras brincadeiras vocais, em que o bebé faz bolhas de saliva, vibra os lábios e começa a imitar os sons dos adultos através de vocalizações. Nesta primeira fase de descoberta e de desenvolvimento, os bebés precisam de brinquedos que estimulem os seus sentidos, a sua perceção, as noções de espaço, peso e volume.

 

Posteriormente, a criança passa para a fase da comunicação verbal, ou seja, a sua comunicação passa a ter uma intenção, um conteúdo e um significado. A criança começa a explorar os brinquedos típicos de causa-efeito, em que carrega e acendem luzes, puxa e faz um som, roda e aparece um boneco. No entanto, a criança ainda brinca com os objetos com uma atitude meramente exploratória, sem lhes atribuir uma utilidade específica ou simbolismo. Porém, à medida que cresce, a linguagem verbal começa a desenvolver-se, a criança aumenta o vocabulário e as palavras são usadas para vários contextos.


A partir dos 2 anos, surge o jogo simbólico, isto é, o brincar ao faz-de-conta. O jogo simbólico permite à criança a construção de um mundo real, pois ao brincar ela depara-se com situações que vive no seu dia-a-dia, podendo assim, compreendê-las melhor. Ao brincar ao faz-de-conta, a criança exercita a imaginação, a capacidade de planear e de fantasiar situações lúdicas, de interagir e de expressar os seus sentimentos. O faz-de-conta promove também o desenvolvimento da linguagem. Ao imitar a mãe ou o pai, ao fingir que é um super-herói ou um polícia, a criança fala e argumenta entre os pares ou individualmente e aprende que as palavras são importantes para representar uma história, organizar um jogo e resolver problemas.


Assim, a comunicação vai-se desenvolvendo nas brincadeiras entre criança-adulto e criança-criança, visto que é na ação do jogo que a criança decifra contextos e aprende a falar. Portanto, à medida que a criança cresce e se desenvolve, as brincadeiras vão-se tornando cada vez mais elaboradas, conduzindo-as assim a situações de aprendizagem mais complexas. Desta forma, as brincadeiras devem ser sempre adequadas ao nível de desenvolvimento de cada criança, de modo a oferecer-lhes oportunidades de adquirir novas aprendizagens.

A Terapia da Fala e o Brincar

Brincar na Terapia da Fala? Sim, claro! Porque o contexto de brincadeira entre o terapeuta e a criança traz inúmeras vantagens. Através do brincar, o terapeuta da fala ajuda a criança a:
  • Aprender e desenvolver novo vocabulário;
  • Desenvolver competências sociais e comunicativas;
  • Aprender a produzir e articular novos fonemas (sons);
  • Participar em conversas;
  • Contar e inventar histórias.
Todos os jogos e atividades lúdicas desenvolvidas nas consultas respeitam os objetivos terapêuticos delineados, tendo em conta as dificuldades apresentadas pelas crianças. Além disso, através do brincar, o terapeuta consegue obter da criança toda a motivação e o envolvimento necessários para a ajudar a encarar novos desafios e a aprender competências que, sem jogos e brincadeiras, poderiam ser mais difíceis de assimilar. Assim, o terapeuta não só contribui para o desenvolvimento da criança, como também possibilita que a terapia seja mais atrativa, facilitando o processo de intervenção terapêutica.
“A brincadeira também age sobre o desenvolvimento da criança como uma vitamina poderosa. Com efeito, quanto mais brinca, tanto mais hábil se torna, e quanto mais hábil se torna, tanto maior a sua vontade de brincar.”

(Ferland, in O desenvolvimento da criança no dia-a-dia: do berço à escola primária)
Bibliografia
  • Alves, F. D., & Sommerhalder, A. (agosto de 2006). O brincar: linguagem da infância, língua do infantil. pp. 125-132.
  • Costa, D. M., & Gontijo, C. M. (2011). A linguagem oral como complemento integrante da brincadeira. pp. 268-288.
  • Coutinho, J. G. (2007). Aprender a Falar, Falar a Brincar: Software Educativo para Intervenção. Aveiro. pp. 1-100
  • Gumieri, F. A., & Treviso, V. C. (2016). A importância do lúdico para o desenvolvimento da criança: o brincar como ferramenta de aprendizagem na Educação Infantil. pp. 66-80.
  • Silva, I. A., & Silva, M. d. (2019). A importância da brincadeira de faz de conta na educação infantil: sob o olhar de professoras . Revista Zero-a-seis. pp. 67-80
  • Sousa, P. A. (s.d). A importância do brincar: brincar e jogar na infância. pp. 1-65
Exemplos de pesquisa: #psicologia, #terapiadafala, ansiedade, voz
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